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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Dos limites do humor




Normalmente digo que os limites do humor não devem existir. 
Sogras, binómio homem-mulher, feios, gordos, carecas, gays, politicos, aleijados, acidentes, doenças mentais, sexo, raças ou religião (entre tantos outros), são temas passíveis de se tornarem piada dependendo do talento do autor. Todos rimos de umas coisas e nos doemos de outras. Abordagens humorísticas sobre o que nos afecta profundamente (ou aos nossos) é  sentido de outro modo. No entanto, é importante notar que há temas que devem (deviam?) ser abordados com cautela e sim, um humorista pode e deve pedir desculpa ou explicar-de quando algo que diz é demasiado grave. E onde está a linha que separa o (mau) gosto do demasiado grave? Não sei bem dizer, mas posso dar um exemplo de um humorista que passou para o outro lado da força: Rafinha Bastos.


Não sigo a carreira da pessoa em questão. (Salvo na fase d'Os Barbichas, pouco ou nada vi dele. O humor brasileiro tem outros artistas que, podendo ser tão corrosivos, fazem-no com outra elegância). Fui repescar este escândalo de 2011 por achar que esta piada num país onde, nesse ano, foram reportados à polícia mais de 12.000 casos de violação, número que se estima ser 10% dos casos totais; num país onde em 10 anos foram assassinadas quase 50.000 mulheres (aqui); num país que anda há semanas envolto em enorme polémica por comentários de teor sexual explícito sobre adolescentes entre os 12-14 anos que participaram num inócuo programa de televisão - denota brutal falta de sensibilidade (entre outras coisas que prefiro não mencionar). E talvez seja só isso. Não é o limite do humor que é ultrapassado, pois talvez esteja bem assim, sem limites sem sentido. Apenas no contexto social, tenha sido um pé no charco. Ou dois, por não ter mais. 


8 comentários:

M* disse...

Eu já tive um episódio de quase violação e apesar de tudo achei uma certa piada ao humor dele, agora quando li. Não porque lhe dê razão, mas porque alguém que viola sabe o que faz e sabe porque o faz, e alguém que é violada não tem culpa e certamente não será feia, caso contrário também não o seria. Por isso, apesar de não ver mal, compreendo que para algumas pessoas este não seja o primeiro pensamento.

redonda disse...

Esta situação fez-me lembrar um episódio da Lei e Ordem, em que também um comediante tinha piadas parecidas, ridicularizava uma estudante universitária que o confrontava e era depois violada e investigavam-no por incitação à violação.

S* disse...

Sou defensora da total liberdade de expressão... mas caramba, que feio!

PM disse...

Muito embora ache que se pode fazer humor com quase tudo há que reconhecer que há piadas muito mal feitas e de mau gosto, não são mesmo piadas, ponto.

Pusinko disse...

Blackeye,
Entendo a perspectiva. Discordo da parte emq ue diz "certamente não será feia, caso contrário também não o seria" quando há mulheres e homens de todos os tamanhos, feitios e feições, assim como idades (>90 anos inclusivé e mais do que um caso isolado). O aspecto de alguém é subjectivo e quando o acto é esse, lidamos com monstros (as) e não com pessoas no seu juizo perfeito.
Quanto a mim, não achei graça mas não quero condenar (pois isso implica criar um muro para limite do humor). Quis mais chamar a atenção para o facto deste dito ficar gigante fora de contexto e cair numa sociedade que facilmente despenaliza a violação para o agressor (ela pediu, ela queria, estava gostosa demais... e vítimas desprotegidas). Gosto deste debate porque andei uns dias relutante com este assunto :)


Redonda,
Eu não sei se um dito do Rafinha numa sala com público restrito pode ter levado a alguma barbaridade e, em tendo, até que ponto faria sentido ele ser acusado de alguma coisa como na série. Apesar de tudo, está na corda bamba do mau gosto.
Enfim, águas passadas. Bom era ver estas estatísticas melhorarem :)


S*
Lá está, o que eu pensei. Não quero que esta seja a minha rolha pessoal no humor, isso legitimaria muitas outras rolhas mas, foi feio e de mau gosto. O povo do dtand up não acerta sempre, isso é certo :)


M* disse...

Pusinko, também é verdade, mas quando afirmo isso quero apenas dizer que essa piada não tem razão de ser, daí que não a ache ofensiva. As pessoas que violam e maltratam têm problemas, o problema não é das vítimas.
Eu entendi a piada dele, mas não concordo que se deva permitir a violação. Da mesma forma que há dias escrevi uma publicação em que não concordava com o facto de uma mulher só por usar saia ou outro tipo de vestuário mais sensual ser logo rotulada de oferecida. Há casos e casos ... Eu pessoalmente não acho que o humor negro tira a importância das situações, acho que a culpa aí é mesmo da sociedade e da sua mentalidade mesquinha e infelizmente duradoura... :/

Pusinko disse...

Blackeye,

Visto por esse prisma - em sendo desprovida de sentido não tem muito por onde ofender - não posso negar a lógica e sorrio ao rever a irritação patente no post.
Mas a mesma frase dita em relação à Índia teria, creio eu, incendiado uma resposta semelhante da minha parte. São exemplos de países onde a violação é, enquanto crime, ignorado em grande escala pela polícia e sociedade. É melhor educar a sociedade do que por freio nos humoristas.
De resto, concordo que o humor negro não tira importância a um assunto em que se foque. Enfatiza de modo provocativo e isso não é mau. É desafiante, invoca reacções intensas como no caso do Rafinha Bastos :)

M* disse...

Pusinko, e esta é apenas a minha opinião em relação ao assunto, porque não conheço (nem tenciono conhecer) o trabalho desse senhor.
Quanto a questão da Índia, aí concordo, mas talvez porque existe a fragilidade deste tipo de problemas lá serem completamente ignorados... enquanto que eu sinto (talvez mal) que a nossa sociedade seja mais "civilizada" (com muitas aspas, aliás).